Como se Controla o Medo de Morrer?

A Morte. Palavra tão simples e tão temida por todos, representa o finito e ao mesmo tempo o desconhecido. Quando me foi pedido para escrever acerca desta temática, a minha mente entrou automaticamente num silêncio desconfortável. Como falar da morte? Porque não gostamos de pensar na morte?

A explicação mais primitiva é a de que, enquanto animais, todos temos um instinto de sobrevivência. Esta característica faz-nos ter comportamentos de fuga e de adiamento da nossa morte. Este mecanismo de defesa da vida, resulta de uma coordenação entre as emoções sentidas e as reações perante a análise de determinada situação. Fugimos porque sentimos medo e esta emoção reflete-se no nosso corpo em forma de ansiedade.

No entanto, vamo-nos debruçar sobre a explicação mais complexa e filosófica. A morte é, para a grande maioria das pessoas, uma coisa estranha. Vivemos o nosso dia a dia, as nossas vidas, como se a morte não existisse. Desde muito cedo, aprendemos a reprimir esta ideia. A nossa sociedade não nos prepara para pensar na morte. Não sabemos o que dizer, como reagir ou como falar dela. Fazemos de conta que esta não existe porque, a maioria de nós, tem um medo terrível de pensar no fim da vida. Porque sentimos medo? Enquanto psicóloga e psicoterapeuta não posso deixar de perguntar: qual é mesmo o problema de morrer? Esta pergunta pode parecer absurda, sem sentido, porque todos sabemos qual é problema, “o problema é o fim”. Peço-vos para pensarem nesta pergunta, tentando abstraírem-se dos padrões e das respostas que nos foram dadas ao longo das nossas vidas. O significado da morte é-nos transmitido como uma verdade incontestável. Como algo que devemos encaixar e não questionar “a vida é assim, todos nós morremos”. Sabemos que é algo inevitável, que esta faz parte da vida, mas não nos foi permitido ter tempo para pensar e processar as nossas emoções acerca deste assunto. Por esta razão, a maioria de nós sente frequentemente algum desconforto perante todas as situações que remetem para a morte, como sejam, funerais; doentes em fase terminal; até uma simples visita a um lar da terceira idade. Não sabemos gerir estas emoções porque nunca tivemos oportunidade de as reconhecer e de trabalhar nelas.

De forma geral, os nossos primeiros “contactos” com a morte, ocorrem nos primeiros anos de vida. Frequentemente, é na infância ou adolescência que nos confrontamos com cenários de perda. Por não termos maturidade emocional, estes acontecimentos traumáticos são processados de acordo com a perceção dos nossos pais e/ou cuidadores. Muitas vezes, são utilizados cenários para romantizar a morte como escape à dura realidade. Na Idade Média, por exemplo, a morte era simbolizada pelo toque dos anjos da morte que levavam a pessoa. Ainda hoje, falamos de estrelas no céu para representar quem já partiu. Porém, todos estes cenários ajudam a aliviar a dor da perda e não a processar o medo da morte.

Falamos em tanatofobia, quando o medo da morte é arrebatadamente elevado e se expressa através de sensações incontroláveis de ansiedade. Esta dificuldade emocional é caracterizada por pensamentos repetitivos e frequentes, relacionados com todas as situações perigosas que possamos ter no dia a dia. Todos estes pensamentos são produtos da nossa mente inconsciente que está em constante hipervigilância perante uma ameaça à sobrevivência. Por norma, este estado de ansiedade é causado por experiências traumáticas que condicionaram a perceção da pessoa perante a morte.

Então como controlar o medo da morte?

Acredito e defendo que o medo do desconhecido é muito pior do que o medo de algo familiar que conhecemos. Dito isto, torna-se importante refletir acerca da morte. Realizar uma introspeção acerca deste tema. Evitando encarar a morte como uma doença que deve ser tratada ou curada, à espera de uma solução que nos permita viver para sempre. Lamento informar, mas é pouco provável isto acontecer (pelo menos, num futuro próximo). Devemos aceitar o facto de que faz parte da nossa vida. Bem sei que todos desejamos que as nossas “boas” nunca acabem. Mas não se iludam, toda a vida acaba e está tudo certo. Lembre-se, o medo da morte pode, inclusive, retirar-lhe qualidade de vida. Pois, ao viver com constante medo, só consegue viver uma amostra da mesma. Convença-se de que, ter medo da morte, nunca irá adiá-la. Nem tão-pouco as estratégias de fuga, como o álcool, as drogas, ou fazer de conta que estamos a festejar a vida, irão ajudá-lo a ultrapassar esta realidade, antes pelo contrário, até podem acelerar o inevitável. A solução é aceitar.

Medo perturbador

Quando o medo não é controlável e perturba toda a estrutura emocional da pessoa, é fundamental procurar ajuda de um profissional de saúde. Neste sentido, o objetivo é perceber quais as razões que o levaram a ter medo de morrer e quando estes medos começaram a perturbar o seu bem-estar emocional. Contudo, tenha sempre o cuidado de distinguir os seus medos, pois o cuidado de evitar situações perigosas é algo perfeitamente natural. No entanto, estar sempre preocupado com os possíveis perigos e estar constantemente num estado de hipervigilância, pode ser problemático e patológico. Para apaziguar estas angústias, o melhor remédio é falar. Falar da morte ajuda a aceitá-la. Em contexto clínico e de acompanhamento psicoterapêutico, estes medos são expostos, são pensados, sentidos e processados, ajudando a pessoa a identificar e a resolver este medo. Em suma, o objetivo psicoterapêutico é o de quebrar o tabu da morte, num ambiente seguro e de confiança. É possível sentir-se em paz relativamente a este assunto.

A morte nunca deve ser vista como uma nuvem negra a pairar sobre o caminho das nossas vidas, mas como algo que irá acontecer, fazendo parte do nosso percurso. Neste sentido, é importante abraçar cada momento, cada experiência e permitir-se saborear as coisas mais simples do dia a dia. Não sabemos quando iremos morrer, mas devemos aceitar que é inevitável, libertando-nos assim deste medo. Viva cada momento da sua vida, não em função do seu fim, mas do caminho até lá chegar.